FÍSICA SEM EDUCAÇÃO

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segunda-feira, 6 de abril de 2015

Resposta à Folha de São Paulo: Deseducação pela greve




OS PROFESSORES, A MÍDIA, AS REIVINDICAÇÕES E O SUBÔNUS



Existem coisas inconcebíveis, principalmente no que diz respeito à educação, ainda mais numa democracia em que o poder deveria emanar do povo. Pessoas, que deveriam ser mais conscientizadas, pois frequentaram as “melhores escolas”, não o são. Refiro-me à maioria dos manifestantes do “Fora Dilma”. Não vou tocar na questão do impeachment, pois esse assunto já deu o que falar, apesar de alguns insistirem, vou abordar a palavra chave: educação e democracia.

Por que a nossa população não vai às ruas exigir uma educação de qualidade? Por que não ajuda os  professores a terem mais condições salariais e estruturais para que nossa educação chegue a um nível de excelência? Não, preferem ir às ruas exigir coisas que, sinceramente, não resolverão o problema do Brasil, mesmo porque nem o presidente, dentro de uma democracia representativa, tem tanto poder assim. Democracia só é feita com um povo conscientizado politicamente e isso significa um povo com uma educação de qualidade e com menos diferenças sociais, culturais e econômicas. E uma educação de qualidade só é possível com educadores de qualidade e, acima de tudo, satisfeitos.

Essa insatisfação dos professores não é de hoje. Faz mais de 30 anos (bem mais) que lutamos por melhorias e, como disse nosso governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, “todo ano é essa novela”, ao se referir à greve. Exatamente,  governador, todo ano. E a coisa não muda. Por que será? Se um governador de um Estado como São Paulo nada faz para melhorar a educação, aí cabe a pergunta do ilustre Paulo Freire ( inclusive hostilizado na última manifestação): “A quem interessa uma educação de qualidade? “ Uma coisa eu garanto, aos governantes é que não interessa. Deveria ser uma preocupação de toda população, mas também não é. E ainda temos uma mídia mais contra do que a favor, pois educação nunca foi o seu foco.

Uma das reivindicações dos professores nessa greve é, obviamente, o salário, mas nosso governador diz não ter dinheiro para tal, pois estamos em plena crise financeira. Alguns jornais até criticaram a greve dos professores por isso. Mas, se estamos em plena crise, por que o nosso governador aprovou o aumento do próprio salário com um  reajuste de 4,5 %, segundo a publicação desse mesmo jornal? Dirão que foi abaixo da inflação. Claro que foi, mas coloque 4,5% em cima de um salário de 2 mil reais e a mesma porcentagem em cima de 20 mil, são aumentos diferentes não é mesmo? Será que falta dinheiro para investimento ou falta competência em gerir esse dinheiro?

Educação deveria ser prioridade do governo e não é o que acontece. Se o orçamento é mais apertado, se o PIB diminuiu, se a atividade econômica retraiu e os impostos pagos foram menores, que se priorize aquilo que é mais importante. Educação não é gasto, é investimento, e há muito todos os especialistas afirmam e confirmam isso.  

Ao invés de diminuir a maioridade penal e ter que construir mais prisões (bandeira defendida por nosso governador), já que as atuais não comportam mais tantos presos, por que não se constroem mais escolas e não investem nos profissionais da educação? Orçamento é administrado, não só financeiramente, mas principalmente de forma política. Sei que investir em educação é como investir em saneamento básico, por exemplo, já que não é algo que se veja, como um Rodoanel, não dá votos. Mas, já está mais do que na hora de nossos governantes ultrapassarem esse conceito ridículo e se preocuparem realmente com aquilo que é importante e prioritário para o povo. Não pagamos poucos impostos, muito pelo contrário, mas muitos preferem pagar dobrado para terem saúde, segurança e educação privadas ao invés de lutar para que esses três itens tenham investimentos adequados do poder público. Não, não falta dinheiro. Falta vontade e interesse. E também é necessário que o investimento na educação tenha uma administração mais correta, mais profissional, mais naquilo que realmente interessa.  Um exemplo são os tablets de péssima qualidade dados a professores que nem conseguem utilizá-los em suas escolas, porque, com raríssimas exceções, não há infraestrutura para tal dentro das salas de aulas. Livros e mais livros são abandonados em escolas,  trocados a cada dois anos por obsoletos, em virtude da falta de cuidado em suas escolhas.  O Estado assina revistas - que são enviadas aos professores e às escolas - sem que nem diretores nem professores opinem sobre sua conveniência, um gasto quase que totalmente inútil.

Além disso tudo e muito mais - que se poderia arrolar - a meu ver há um total absurdo na administração da própria carreira do professorado, como o tal do bônus, baseado num suposto mérito cujos índices de premiação são completamente desconhecidos, já que não temos acesso às correções de provas do SARESP(*), nem aos critérios que estabelecem os valores e estipulam o ranking das escolas. O processo não tem nenhuma transparência, o que nos leva a pensar que são colocadas em mesmo nível de comparação escolas mais bem aparelhadas e bem localizadas com escolas mais "pobres", de zonas rurais distantes de cidades e grandes centros. Então, o professor não sabe nunca se e quanto vai receber do tal bônus. O que o torna aquilo que eu chamo de "subônus", porque, em vez de estimular o profissional, quase sempre o decepciona, encobrindo com alguns reais pingados a real situação do magistério. E qual o intuito disso? Desestabilizar a categoria, só pode.

Outra coisa: a divisão em categorias, que é o que há de pior. Os não efetivos se veem cada ano em uma escola com turmas diferentes e, como não criam vínculos, isso gera insegurança por parte dos professores, que têm de lidar com o desrespeito e a indisciplina dos alunos, tornando o aprendizado difícil. Em geral, são profissionais em início de carreira, o que leva a muitos a se sentirem desprestigiados e a abandonarem o magistério, perdendo, com isso o Estado, muitos talentos.

Não se pode negar que haja, em algumas escolas, problemas graves de indisciplina, e até violência. Mas, esse não é e não pode ser o parâmetro para julgarem a escola pública. Quando explode na mídia um caso extremo, ficamos todos, os professores que lidamos no dia a dia de nossas escolas, extremamente incomodados com a repercussão e com a visão deturpada que esse tipo de reportagem passa para a comunidade. É, sim, uma queixa que temos com relação à midia, que despreza os pontos positivos, para destacar os pontos negativos, sem nos ouvir em relação aos problemas, que são muitos, e nem sempre ligados àquilo que é publicado. É mais fácil fotografar e filmar uma escola em péssimas condições do que discutir com a categoria problemas relacionados às condições de vida e de trabalho que nos atormentam diariamente.


Enfim, nós, professores lutamos por dignidade, palavra talvez difícil de ser explicada, mas que resume nossa luta não só por melhores salários, mas também, e principalmente, por melhores condições de trabalho; por escolas adequadas, higiênicas, acolhedoras; por cursos periódicos de reciclagem e atualização; pela preparação mais cuidadosa dos gestores e orientadores pedagógicos; por currículos adequados à realidade do aluno e de suas necessidades futuras; por mais transparência e participação nas decisões que afetem a categoria e o próprio ensino. Em vez de defender o aprisionamento de jovens e a construção de mais cadeias, pregamos a necessidade de investir no ensino, na educação como um todo, como a única forma de tornar o País realmente desenvolvido. Pois, como já dizia Pitágoras, "eduquemos as crianças e não será necessário punir os homens".



(*)Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo


PS. Espero que publiquem

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