OS PROFESSORES, A MÍDIA, AS
REIVINDICAÇÕES E O SUBÔNUS
Existem coisas inconcebíveis,
principalmente no que diz respeito à educação, ainda mais numa democracia em
que o poder deveria emanar do povo. Pessoas, que deveriam ser mais
conscientizadas, pois frequentaram as “melhores escolas”, não o são. Refiro-me
à maioria dos manifestantes do “Fora Dilma”. Não vou tocar na questão do
impeachment, pois esse assunto já deu o que falar, apesar de alguns insistirem,
vou abordar a palavra chave: educação e democracia.
Por que a nossa população não vai
às ruas exigir uma educação de qualidade? Por que não ajuda os professores a terem mais condições salariais
e estruturais para que nossa educação chegue a um nível de excelência? Não,
preferem ir às ruas exigir coisas que, sinceramente, não resolverão o problema
do Brasil, mesmo porque nem o presidente, dentro de uma democracia representativa,
tem tanto poder assim. Democracia só é feita com um povo conscientizado
politicamente e isso significa um povo com uma educação de qualidade e com
menos diferenças sociais, culturais e econômicas. E uma educação de qualidade
só é possível com educadores de qualidade e, acima de tudo, satisfeitos.
Essa insatisfação dos professores
não é de hoje. Faz mais de 30 anos (bem mais) que lutamos por melhorias e, como
disse nosso governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, “todo ano é
essa novela”, ao se referir à greve. Exatamente, governador, todo ano. E a coisa não muda. Por
que será? Se um governador de um Estado como São Paulo nada faz para melhorar a
educação, aí cabe a pergunta do ilustre Paulo Freire ( inclusive hostilizado na
última manifestação): “A quem interessa uma educação de qualidade? “ Uma coisa
eu garanto, aos governantes é que não interessa. Deveria ser uma preocupação de
toda população, mas também não é. E ainda temos uma mídia mais contra do que a
favor, pois educação nunca foi o seu foco.
Uma das reivindicações dos
professores nessa greve é, obviamente, o salário, mas nosso governador diz não
ter dinheiro para tal, pois estamos em plena crise financeira. Alguns jornais
até criticaram a greve dos professores por isso. Mas, se estamos em plena crise,
por que o nosso governador aprovou o aumento do próprio salário com um reajuste de 4,5 %, segundo a publicação desse
mesmo jornal? Dirão que foi abaixo da inflação. Claro que foi, mas coloque 4,5%
em cima de um salário de 2 mil reais e a mesma porcentagem em cima de 20 mil,
são aumentos diferentes não é mesmo? Será que falta dinheiro para investimento
ou falta competência em gerir esse dinheiro?
Educação deveria ser prioridade
do governo e não é o que acontece. Se o orçamento é mais apertado, se o PIB
diminuiu, se a atividade econômica retraiu e os impostos pagos foram menores,
que se priorize aquilo que é mais importante. Educação não é gasto, é
investimento, e há muito todos os especialistas afirmam e confirmam isso.
Ao invés de diminuir a maioridade
penal e ter que construir mais prisões (bandeira defendida por nosso
governador), já que as atuais não comportam mais tantos presos, por que não se constroem
mais escolas e não investem nos profissionais da educação? Orçamento é
administrado, não só financeiramente, mas principalmente de forma política. Sei
que investir em educação é como investir em saneamento básico, por exemplo, já
que não é algo que se veja, como um Rodoanel, não dá votos. Mas, já está mais
do que na hora de nossos governantes ultrapassarem esse conceito ridículo e se
preocuparem realmente com aquilo que é importante e prioritário para o povo. Não
pagamos poucos impostos, muito pelo contrário, mas muitos preferem pagar
dobrado para terem saúde, segurança e educação privadas ao invés de lutar para
que esses três itens tenham investimentos adequados do poder público. Não, não
falta dinheiro. Falta vontade e interesse. E também é necessário que o
investimento na educação tenha uma administração mais correta, mais
profissional, mais naquilo que realmente interessa. Um exemplo são os tablets de péssima qualidade
dados a professores que nem conseguem utilizá-los em suas escolas, porque, com
raríssimas exceções, não há infraestrutura para tal dentro das salas de aulas.
Livros e mais livros são abandonados em escolas, trocados a cada dois anos por obsoletos, em
virtude da falta de cuidado em suas escolhas. O Estado assina revistas - que são enviadas
aos professores e às escolas - sem que nem diretores nem professores opinem
sobre sua conveniência, um gasto quase que totalmente inútil.
Além disso tudo e muito mais -
que se poderia arrolar - a meu ver há um total absurdo na administração da
própria carreira do professorado, como o tal do bônus, baseado num suposto
mérito cujos índices de premiação são completamente desconhecidos, já que não temos
acesso às correções de provas do SARESP(*), nem aos critérios que estabelecem
os valores e estipulam o ranking das escolas. O processo não tem nenhuma
transparência, o que nos leva a pensar que são colocadas em mesmo nível de
comparação escolas mais bem aparelhadas e bem localizadas com escolas mais
"pobres", de zonas rurais distantes de cidades e grandes centros.
Então, o professor não sabe nunca se e quanto vai receber do tal bônus. O que o
torna aquilo que eu chamo de "subônus", porque, em vez de estimular o
profissional, quase sempre o decepciona, encobrindo com alguns reais pingados a
real situação do magistério. E qual o intuito disso? Desestabilizar a categoria,
só pode.
Outra coisa: a divisão em categorias,
que é o que há de pior. Os não efetivos se veem cada ano em uma escola com
turmas diferentes e, como não criam vínculos, isso gera insegurança por parte
dos professores, que têm de lidar com o desrespeito e a indisciplina dos
alunos, tornando o aprendizado difícil. Em geral, são profissionais em início
de carreira, o que leva a muitos a se sentirem desprestigiados e a abandonarem
o magistério, perdendo, com isso o Estado, muitos talentos.
Não se pode negar que haja, em
algumas escolas, problemas graves de indisciplina, e até violência. Mas, esse
não é e não pode ser o parâmetro para julgarem a escola pública. Quando explode
na mídia um caso extremo, ficamos todos, os professores que lidamos no dia a
dia de nossas escolas, extremamente incomodados com a repercussão e com a visão
deturpada que esse tipo de reportagem passa para a comunidade. É, sim, uma
queixa que temos com relação à midia, que despreza os pontos positivos, para
destacar os pontos negativos, sem nos ouvir em relação aos problemas, que são
muitos, e nem sempre ligados àquilo que é publicado. É mais fácil fotografar e
filmar uma escola em péssimas condições do que discutir com a categoria
problemas relacionados às condições de vida e de trabalho que nos atormentam
diariamente.
Enfim, nós, professores lutamos
por dignidade, palavra talvez difícil de ser explicada, mas que resume nossa
luta não só por melhores salários, mas também, e principalmente, por melhores
condições de trabalho; por escolas adequadas, higiênicas, acolhedoras; por
cursos periódicos de reciclagem e atualização; pela preparação mais cuidadosa
dos gestores e orientadores pedagógicos; por currículos adequados à realidade
do aluno e de suas necessidades futuras; por mais transparência e participação
nas decisões que afetem a categoria e o próprio ensino. Em vez de defender o
aprisionamento de jovens e a construção de mais cadeias, pregamos a necessidade
de investir no ensino, na educação como um todo, como a única forma de tornar o
País realmente desenvolvido. Pois, como já dizia Pitágoras, "eduquemos as
crianças e não será necessário punir os homens".
(*)Sistema de Avaliação de
Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
PS. Espero que publiquem
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